terça-feira, 4 de agosto de 2009

Hemorragia subaracnóidea - manejo clinico na emergência

O paciente que tem o diagnóstico de hemorragia subaracnóidea (HSA) deve ser prontamente internado em uma unidade onde seja possível a monitorização hemodinâmica. Dez por cento dos pacientes vão a óbito antes de chegar ao hospital e somente 1/3 alcança um "bom resultado" após o tratamento. A letalidade nos primeiros 30 dias pode chegar a 50% e os fatores que melhor predizem o prognóstico agudamente são: nível de consciência e grau neurológico à admissão, idade (relação inversa), quantidade de sangue no espaço subaracnóide na primeira TC de crânio (relação inversa).

Hiperglicemia também se associa a uma mau prognóstico, assimo como os achados de infarto cerebral e vasoespasmo sintomático.

Há diversas tabelas de classificação de risco do paciente, de acordo com o exame neurológico:

1) A escala de Hunt e Hess;

2) A escala da World Federation of Neurological Surgeons, que incorpora a escala de coma de Glasgow;

3) O índice de vasoespasmo de Fisher, baseado no padrão da hemorragia à TC;

4) O sistema de Ogilvy e Carter, que incorpora as outras escalas.


Manejo agudo


1) Admissão em unidade de tratamento intensivo para monitorização hemodinâmica.

2) Prescrição de laxativos, repouso ao leito e analgesia adequada, com o objetivo de reduzir as vaiações hemodinâmicas e o risco de ressangramento.

3) Doppler transcraniano basal, para comparação com a progressão do tratamento e uso seriado para monitorar a principal complicação, o vasoespasmo.

4) Prevenção de TVP com meias pneumáticas. Após o tratamento cirúrgico do aneurisma, é autorizada a utilização de heparina não fracionada 5000 UI SC 3x/d.


5) Interrupção da medicação antitrombótica


5.1) Suspensão de qualquer tratamento anticoagulante ou antiplaquetário.

5.2) Prescrição de medidas de reversão de efeitos de terapia antitrombótica, como vitamina K IM, plasma fresco congelado, concentrado de complexo protrombina inativada,


6) Hipertensão intracraniana e hipertensão arterial


6.1) Geralmente o aumento da pressão intracraniana é secundário à hidrocefalia e a hiperemia reativa pós-hemorragia.

6.2) O aumento da PIC pode prejudicar a pressão de perfusão cerebral, já que esta é função da PAM (pressão arterial média), subtraída da PIC.

6.3) A terapia ótima da pressão arterial em uma HSA aguda ainda está por ser determinada, pois toda vez que se faz controle restrito da PA deve ser considerado o menor risco de sangramento, porém o maior risco de infarto cerebral.

6.4) Se há não monitorização invasiva da PIC, o ideal é adiar o tratamento da HAS, devido à sua natureza compensatória aguda e às incertezas quanto aos desfechos secundários a esta medida. Em pacientes alertas, conscientes, é possível manter a PAS em um nível próximo a 140 mmHg.

6.5) Em caso de necessidade de diminuição da PA, deve-se evitar o uso de nitroprussiato ou de nitroglicerina, devido à sua propensão a aumentar o volume sanguíneo cerebral e , por consequência, a PIC. Deve ser dada preferência ao Labetalol (infelizmente droga ainda não disponível no Brasil).


7) Nimodipina - o racional do uso da nimodipina na hemorragia subaracnóidea é baseado no mecanismo de ação desse bloqueador dos canais de cálcio: seus efeitos vasodilatadores cerebrais seriam potencialmente benéficos para a prevenção do vasoespasmo. Apesar de não haver evidência angiográfica ou sintomática de que essa medicação reduza realmente a incidência de vasoespamos, há um claro benefício de desfechos, com aumento da probabilidade de bons resultados, e diminuição das taxas de déficit, morte e infarto na TC de crânio. Há um estudo que sugere uma redução de 24% no risco relativo de mau desfecho, com um NNT de 13.

Qual seria o mecanismo de benefício? Suposta neuroproteção por redução da excitotoxicidade cálcio-dependente, diminuição da agregação plaquetária, dilatação de pequena artérias invisíveis à angiografia, inibição da isquemia por produtos de degradação dos eritrócitos etc.


8) Fatores independentes relacionados à pior prognóstico: hipoxemia (gradiente alvéolo-arterial de O2 maior que 125 mmHg, acidose metabólica (bicarbonato menor que 20), hiperglicemia (maior que 180 mg/dL) e instabilidade cardiovascular (PAM menor que 70 mmHg ou maior que 130 mmHg).


9) Profilaxia de crises convulsivas - assunto controverso. Alguns autores sugerem que a decisão de usar anticonvulsivante profilático é justificada pelo grande dano adicional trazido por uma crise nesse cenário, porém outros justificam a não prescrição com estudos que mostraram piores desfechos nos pacientes que utilizaram tais medicações. Outros sugerem que o padrão da distribuição do sangue no espaço subaracnóide dá informações úteis quanto ao uso ou não de profilaxia anticonvulsivante.


10) Antitrombóticos - ausência de benefício, maior risco de isquemia. Não usar.


11) Glicocorticóides - não há evidência suficiente que justifique o seu uso ou não uso.


12) Prevenção do vasoespasmo - essa complicação é mais frequente nos pacientes com HSA. Começa a ocorrer em torno do 3o dia do pós-ictus, com pico no 7o dia. É identificado como uma piora do estado neurológico, incluindo o início de novos sinais focais.


13) Terapia hiperdinâmica (os 3 H's) - hipervolemia, hipertensão arterial (com fenilefrina ou dopamina) e hemodiluição - deve ser usada após a oclusão do aneurisma.


14) Estatinas - há alguns estudos controlados que sugerem que o uso de pravastatina 40 mg/d ou de sinvastatina 80 mg/d , dentro de 48-72h do ictus, pode melhorar os desfechos desses pacientes, por um também suposto efeito sobre a reatividade vasomotora cerebral, up-regulatoin da óxido nítrico sintetase, atenuação da vasculopatia.


15) Tratamento cirúrgico - o tratamento operatório deve ser feito, preferencialmente, por microcirurgia de clipagem do aneurisma roto. A terapia por via endovascular é uma alternativa incipiente que vem mostrando bons resultados. O tratamento deve ser preferencialmente feito antes do 3o dia ou após o 14o dia, quando o risco de vasoespasmo é menor.