A síndrome da angústia respiratória aguda foi recentemente reconhecida (nos anos 1960), graças aos avanços nas técnicas de ventilação mecânica. Foi reconhecida por médicos militares nos hospitais de guerra no Vietnam, pelos quais foi chamada de "pulmão de choque" e por médicos civis, no mesmo período, que a denominaram de síndrome da angústia respiratória do adulto.
Definição:
É a lesão final comum do espectro da "injúria pulmonar aguda".
Por bastante tempo, houve bastante controvérsia e heterogeneidade na definição da síndrome, somente sanados na Conferência para o Consenso Americano/Europeu sobre SARA, realizada em 1994, e publicada no American Journal of Respiratory Critical Care Medicine.
Lesão pulmonar aguda (LPA): é definida como uma síndrome de inflamação pulmonar aguda e persistente, associada a aumento da permeabilidade vascular. Faz parte de uma síndrome de edema pulmonar agudo não-cardiogênico. Tem 4 características essenciais:
1. Início agudo (geralmente, 4 a 48 horas); 2. Opacidades alveolares bilaterais consistentes com edema pulmonar; 3. Uma razão entre a pressão parcial arterial de oxigênio e a fração inspirada de oxigênio (PaO2/FiO2) com valores entre 201 e 300 mmHg, independente dos valores da PEEP (pressão positiva no fim da expiração). 4. Ausência de evidência clínica de aumento da pressão atrial esquerda - caso seja medida por cateter de Swan-Ganz, a pressão capilar pulmonar de encunhamento deve ser de 18 mmHg ou menos.
Síndrome da angústia respiratória aguda (SARA): a definição é a mesma da lesão pulmonar aguda, com a exceção da hipoxemia, que é mais grave - a relação PaO2/FiO2 deve ser menor que 200 mmHg, independentemente da PEEP aplicada. A demonstração de diminuição da complacência pulmonar é frequente, porém não figura entre os critérios.
A distinção entre a LPA e a SARA é, portanto, algo arbitrária, porque a relação PaO2/FiO2 não apresenta boas correlações com o prognóstico, a sobrevida ou a gravidade da lesão pulmonar, talvez porque tenha relações com os parâmetros ventilatórios, em alguns pacientes.
As lesões pulmonares crônicas, como a sarcoidose e a fibrose pulmonar idiopática são exemplos de doenças que não se enquadram totalmente no critério, por terem início subagudo ou crônico. É importante, ainda, lembrar que a SARA não deve ser vista unicamente como uma síndrome pulmonar aguda que acompanha lesã de outros órgãos, já que, apesar da correlação frequente, há casos em que não há lesão concomitante, como na tromboembolia gasosa maciça e nos danos alveolares por inalação de gases tóxicos.
A lesão histológica encontrada precocemente na SARA é o dano alveolar difuso.
Epidemiologia
LPA:
Incidência ajustada à idade: 86/100.000 pessoas-anos;
Mortalidade intrahospitalar: 39%
SARA:
Incidência ajustada à idade: 64/100.000 pessoas-anos;
Mortalidade intrahospitalar: 41%
Representa 15% dos pacientes admitidos em unidades de terapia intensiva e 20% daqueles que necessitam de ventilação mecânica.
Diagnóstico:
Lembra muito (clinicamente e radiologicamente) o edema pulmonar cardiogênico, especialmente nos primeiros dias - a diferenciação entre os dois é muito baseada no contexto do desenvolvimento do edema pulmonar.
Testes diagnósticos:
BNP (peptídeo natriurético cerebral): estudos têm sugerido seu uso para a diferenciação entre a SARA e o edema pulmonar agudo cardiogênico, em alguns casos.
Ecocardiograma transtorácico: muitos clínicos têm usado essa ferramenta, quando o mecanismo do edema não pôde ser definido pela dosagem no BNP ou pela avaliação clínica. A detecção de disfunção valvar aórtica ou mitral grave ou diminuição da fração de ejeção afastam o diagnóstico de SARA. Já a presença de IC diastólica associada a sobrecarga de volume secundária a insuficiência renal aguda pode ser um diagnóstico difícil de ser distinto somente com este exame.
Cateterização da artéria pulmonar: pode ser considerada para diferenciar o edema hemodinâmica do de permeabilidade, se a avaliação clínica e os exames acima não forem suficientes. Aumenta muito a probabilidade do mecanismo do edema ser aumento anormal na pressão capilar hidrostática pulmonar se a pressão capilar pulmonar de encunhamento for maior que 18 mmHg. É importante levar em consideração que os valores podem estar falsamente elevados se houver o uso de altos níveis de PEEP. Ainda assim, é imperioso recordar que, em 20% dos casos, pacientes com SARA tem disfunção ventricular esquerda concomitante!
Diagnóstico diferencial:
- Edema pulmonar hemodinâmico
- Hemorragia alveolar difusa - IRpA + queda inexplicada na concentração de hemoglobina ou hemoptise (que pode não ser vista antes da intubação orotraqueal);
- Pneumonia intersticial aguda (Síndrome de Hamman-Rich): síndrome clínica fulminante de SARA idiopático + achado patológico de dano alveolar difuso em organização;
- Pneumonia eosinofílica aguda idiopática: curso de vários dias, em indivíduos previamente hígidos, com tosse, dispnéia, febre e, eventualmente, dor torácica + eosinófilos no lavado broncoalveolar + resposta a tratamento com metilprednisolona 1 mg/kg em 48 h + recuperação completa
- Disseminação linfangítica de tumores sólidos, linfoma, leucemia aguda.
Causas e condições predisponentes: 60% das causas são identificáveis. As mais comuns são descritas abaixo.
1. Sepse (em primeiro lugar)
2. Aspiração de conteúdo gástrico
3. Pneumonias comunitárias e nosocomiais
4. Trauma grave e queimaduras
4.1 - Contusão pulmonar bilateral
4.2 - Embolia gordurosa após fraturas de ossos longos
4.3 - Sepse pós-traumática (dias após o evento)
5. Transfusão maciça de sangue (mais de 15 unidades)
6. Lesão pulmonar relacionada a transfusão (não maciça, mecanismo desconhecido, evolui em ate 6 horas);
7. Transplante de medula óssea e de pulmão
8. Overdose de drogas (AAS, cocaína, opióides, fenotiazinas e tricíclicos)
9. Efeito idiosincrático de drogas em dose terapêutica (quimioterápicos, protamina, nitrofurantoína)
10. BOOP
11. Tuberculose miliar
12. Outros (bypass cardiopulmonar, pneumectomia, pancreatite aguda, afogamento)
Referências interessantes:
2. Artigas, A, Bernard, GR, Carlet, J, et al. The American-European consensus conference on ARDS, part 2. Ventilatory, pharmacologic, supportive therapy, study design strategies, and issues related to recovery and remodeling. Am J Respir Crit Care Med 1998; 157:1332.